segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

O rolezinho

Há alguns anos vivemos em nossas ilhas: condomínios fechados, shoppings, carros com ar-condicionado, janela insulfilmada fechada e portas travadas. Convivemos só com nossos iguais, não ocupamos os espaços públicos por serem “cheios de bandido e maconheiro”, temos medo daquele moleque magrelo que ouve funk no metrô e encaramos com naturalidade quando governantes colocam pedras debaixo de viadutos e divisórias em bancos de praça, afinal, ali não é lugar de vagabundo.

Aí, de repente, a molecada sai dos seus cantos na periferia e insiste em ser visível. Meu Deus, eu pago meus impostos, fico meia hora procurando vaga aqui no shopping pra poder dar um passeio saudável com a minha família, quero poder consumir sem medo aqui onde só tem gente como eu, afinal, eu trabalho tanto pra quê, pra poder comprar, né? Mas pelo jeito eles insistem em invadir nosso espaço, o que aconteceu com aquela música “Cada um no seu quadrado”? Chegam em bandos, falando alto e com gírias que eu não entendo, com seus bonezões de aba reta e suas calças largas com a cueca aparecendo pra nos assustar(quanto mau gosto!), e, ainda por cima, ouvindo esse tal funk ostentação, música que só gente sem berço poderia criar.

O que eles pensam, será que não tiveram educação? Puxa vida, vocês podem se divertir, mas fiquem nos seus bairros, onde vocês são quase invisíveis e eu posso continuar fingindo que está tudo bem enquanto eu tiver dinheiro pra ter meu carro e fazer compras no shopping. Volto a repetir: cada um no seu quadrado!

Mas tudo bem, o shopping nos protege, ele entra na Justiça, e como a Justiça adora manter as coisas como são pra evitar problemas, ela proíbe o rolezinho. O quê? Eles vieram mesmo assim? Tou dizendo que esses vândalos não respeitam nada, não têm educação, que escola será que eles frequentaram, hein?

Sorte que existe a polícia, né? E dá-lhe bala de borracha, gás de pimenta e cacetada nessa molecada que insiste em estragar o passeio das pessoas de bem nesse templo sagrado que é o Shopping Center.

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

A fidelidade masculina

Não vou escrever sobre por que os homens traem, nem se traem mais ou menos do que as mulheres. Na verdade acho que ambos traem com a mesma frequência, talvez por motivos diferentes; o que acontece é que, enquanto uma mulher pode sair durante meses com o cara que ela conheceu na academia sem nem a irmã saber, o cara sai duas vezes com uma mulher do trabalho e logo até o porteiro tá sabendo.

Mas hoje vou falar sobre a fidelidade dos homens ao seu barbeiro ou cabeleireiro. Muitas vezes ouvi mulheres com quem trabalhei falando que a Márcia tá com um preço ótimo nas luzes, que a Fátima faz a melhor escova permanente da cidade ou que quando a ocasião é especial ela vai ao salão da Fabíola, porque lá dá pra fazer tudo em um lugar só.

Homem em geral não faz isso. Ok, deve ser estranho pra quem me conhece eu escrever sobre esse assunto, afinal, sou careca há uns sete anos. Mas, embora ainda escute risinhos quando digo que estou indo cortar o cabelo, eu vou. No meu primeiro corte, quando tinha um ano e cabelo encaracolado, meu pai me levou ao barbeiro dele, e lá fiquei até meus 13 anos. Só parei porque ele ficou velho e coincidentemente ficou doente quando começou a cortar orelhas e deixar falhas no cabelo dos fregueses. As falhas ele deixou no meu cabelo, o corte foi na orelha do meu pai. Aí passei mais uns dois anos cortando com dois caras que tinham salão meio longe, ficaram careiros e depois cada um teve seu salão, mais uns quatro em um cabeleireiro perto de casa, e parei quando ele resolveu que não ia mais cortar cabelos, mas fabricar sacolas de plástico pra supermercados.

Coincidentemente, foi aí que comecei a fazer Tiro de Guerra (pra quem não sabe, é um quartel mais light, só de manhã e umas 2 ou 3 guardas por mês) e de 15 em 15 dias dois cabeleireiros iam lá raspar nosso cabelo pela metade do preço que cobravam. Um deles, mesmo recebendo menos, fazia o trabalho direito, enquanto outro fazia correndo. A gente sabia só de olhar pros cabelos uns dos outros com quem você tinha dado a sorte ou azar de raspar o seu.

E aí entra a tal fidelidade. Desde então eu raspo meu cabelo, e de um ano pra cá acerto a barba, com esse mesmo cara, o Fabiano, o que raspava direito. É um ritual ir ao barbeiro/cabeleireiro, é a oportunidade de falar sobre política, trabalho, mulher e futebol sem se preocupar, simplesmente ir falando o que der na telha. Hoje vejo que essa fidelidade tem paralelo com outra fidelidade, a de uma pessoa a seu time de futebol: ele é santista, viúva de Pelé, Robinho e agora Neymar, eu sou corinthiano, atualmente viúvo de gols.

Em 99, ano em que fiz o Tiro de Guerra, o Corinthians tinha provavelmente o time mais forte tecnicamente da sua história, com Dida, Rincón, Vampeta, Marcelinho, Luizão, Edilson, Ricardinho; o Santos tinha um time mediano e vinha em um jejum de 15 anos sem títulos. Essa fidelidade passou pela (semi)final antecipada do Paulista de 2001, em que quem vencesse estava com a mão na taça, pois com certeza derrotaria o Botafogo de Ribeirão na final. O Corinthians fez um gol nos acréscimos e eu tive combustível pra tirar sarro dele no meu próximo corte. Aí veio 2002, e aquela final em que Robinho e Diego acabaram com meu time, então o favorito. Teve 2004, em que o Santos foi campeão e o Corinthians precisou do Tite pra sair da zona de rebaixamento para terminar em um então mais que suficiente 5º lugar.

Claro, não posso deixar de lembrar aquele eterno 7 x 1 em que Nilmar e Tevez deitaram e rolaram, esse foi mais ou menos como a pedalada do Robinho, um tirava sarro e o outro nem tinha o que dizer, só sorria amarelo. Aí vieram Ronaldo, Neymar, os times ganhando Libertadores em anos consecutivos e ultimamente nenhum dos dois tem muito o que dizer,  o Santos tem um time meia-boca e o Corinthians um time forte no papel, mas que na prática não faz gol nem com macumba ou reza braba e que dá sono de assistir.

Mas e aí, eu continuei morando em Avaré todo esse tempo pra continuar cortando cabelo com o mesmo cara? Não, de 2000 pra cá morei um tempo em Londrina, em Santos e Botucatu, anos em Bauru, um ano em São Paulo e agora estou há mais de dois anos em Campinas. Mas nas minhas idas mensais a Avaré sempre teve isso, ir ao Fabiano dar uma acertada na careca, tirar sarro do Santos ou aguentar ele tirando sarro do Corinthians.


Aliás, Fabiano, vai abrir o salão no sábado do feriado?

quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Sobre pessoas e gavetas

Temos mania de engavetar as pessoas. Não tou falando no sentido de guardar pra depois, mas de separar as pessoas em gavetas, como a gente faz com cuecas e meias. As meias vão nessa gaveta, as cuecas naquela... Uma meia não serve como cueca, uma cueca não dá pra usar como meia.

A questão é que pessoas não são meias nem cuecas, e a gente as classifica porque é mais cômodo, mas fácil ver as pessoas assim. Acho que algumas obras de ficção também ajudam, elas estão cheias de estereótipos, poucos autores são capazes de passar a complexidade que é o ser humano.

Se a gente não conhece alguém, mas sabe que essa pessoa gosta de muito de ler, provavelmente vamos pensar nela como o gordinho tímido que mal consegue fazer contato visual, se alguém diz que gosta de novela, pensamos que deve ser alienada, se admite que gosta de ir à academia, deve ser daqueles que não sabem nem o nome do prefeito e malemá escreve o nome. Se uma mulher transa no primeiro encontro, vai pra gaveta das fáceis,- como se uma pessoa seguir a própria cabeça e fazer o que sente vontade fosse defeito- se um cara te trata bem, é pra gaveta dos legais, se trata com desprezo, deve ser a versão acessível do Wolverine. E a gente repete esse padrão em tudo, na visão política, no trabalho...

Quantas vezes não nos permitimos conhecer direito alguém, seja um amigo, colega de trabalho ou alguém por quem temos ou que tem na gente algum interesse pessoal? Quantas vezes colocamos as pessoas numa gavetinha e não permitimos que ela mostre que é muito mais do que a gente está vendo, que gaveta não é lugar pra pessoas?

Na época de Unesp cansei de ouvir o pessoal da comunicação dizendo que engenheiro é tudo tapado e engenheiro dizendo que na comunicação só tinha vagal e bicho grilo. Claro que eu também já fiz brincadeiras assim, mas me cuidava pra que isso ficasse só na piada, na provocação. Nunca deixei de ser amigo de alguém porque ele parecia se encaixar em uma gaveta que não me agradava. Se a gente percebesse quanta gente legal deixamos de conhecer porque nos recusamos a vê-la como uma pessoa real, cheia de contradições e paradoxos...

Não vá pelo caminho mais fácil, não coloque as pessoas numa gaveta etiquetada, elas são mais complexas do que parecem dentro das gavetinhas que você criou na sua cabeça. Ah, se isso tem algo de autobiográfico? Claro, eu gasto dinheiro com livros e whey protein e não sou nem o gênio letrado nem a porta bombada que só sabe contar o número de repetições do supino. 

quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Crescendo


Aprender a pegar laranja e mexerica no pé com os tios, aprender os nomes dos bichos de plástico com um deles, querer ajudar o pai a consertar a moto da empresa e quebrar o farol na martelada. Ouvir história do Cascão, brincar de jogo da memória com sua tia, ganhar e até hoje não saber se você era bom ou se ela deixava, apanhar morango na horta com a outra tia, esperar sua tia de Santos no Natal. Dormir à tarde pra poder ver filme que acabava tarde, crescer brincando na rua de terra, brincar de Playmobil fazendo buraco nessa rua de terra. Polícia e ladrão, mãe da rua, esconde-esconde e pega-pega na rua sem perigo de ser atropelado. Esperar os primos na Páscoa, nas férias de julho e no Natal. Ir com eles comer cachorro quente nos trailers da Concha Acústica e depois tomar sorvete na Eiffel ou na Golfinho. Jogar bola na rua e no quintal da vó até ela xingar porque quer ver televisão. Ver sua mãe ir na sua escolinha descobrir qual o doce que você viu um menino comendo e tá com vontade. Ir pra escola sozinho desde pequeno sem isso ser nem um pouco perigoso. Ver sua cachorrinha correr pelo quintal, ficar velhinha e morrer dormindo, jogar capucheta com pedra pra cima e na queda essa pedra acertar a cabeça duma criança bem quando seu pai tá passando. Jogar bola na rua de cima. Soltar pipa que o seu amigo empinou pra você porque você não sabe, bolinha de gude que você é meia-boca, bater bafo, jogar botão e finalmente ser bom numa brincadeira dessas tradicionais. Trocar figurinha do Campeonato Brasileiro, da Copa e do Ping-Pong. 

Ter uma das letras mais feias e uma das melhores notas da classe, ser representante de classe sem saber exatamente pra que serve além de buscar giz pra professora. Ver a primeira Copa na hora do almoço e achar a coisa mais legal do mundo, comemorar o primeiro Brasileirão do Corinthians levado nas costas pelo Neto, ir brincar na casa dos amigos de escola, não gostar de videogame, passar a gostar de videogame, assistir Mundo da Lua, pegar santinho no chão em dia de eleição. Mudar de casa, fazer amizade com a molecada da rua nova, jogar bola na rua nova o dia inteiro, ter um time pra jogar contra time de outros bairros, outras escolas, outras ruas. Estudar inglês desde pequeno, ser ruim em matemática na escola mas aprender a fazer conta de cabeça e perceber que você faz dum jeito esquisito como seu tio, andar de bicicleta com uma gangue duns 15 moleques nas noites quentes, achar superlegal quando seu tio de Brasília chega do nada numa quinta-feira e quer ir pra represa, descobrir o computador mas logo achar que não tem muita graça e só voltar a ele anos depois. Assistir Anos Incríveis e quase decorar os diálogos de tanto ver, começar a ter bronquite, entrar no tae kwon do, ser escalado pra jogar de volante e ir pra frente tentar fazer gol, entrar pra natação, fazer acupuntura e sarar da bronquite. Sair da natação porque acha chato, entrar na musculação porque pesa 49kg, ser um adolescente cheio de amigos mas meio tímido, saber os nomes dos jogadores de todos os times da Copa, ver o Romário arrebentar na Copa, descobrir que o Aldair joga muito, detestar o São Paulo por ganhar tudo, detestar o Palmeiras por ganhar tudo, simpatizar com o Santos por não ganhar nada. 

Começar a ir na domingueira com 13 anos, começar a sair de sábado com 15 sem seus pais acharem que você vai morrer ou ser sequestrado, comer cachorro quente no China ou lanche no Cavalinho. Passar pela moda da botina, da camisa xadrez, do moletom Hard Rock e Planet Hollywood, faltar na primeira aula da segunda porque a domingueira foi cansativa. Ver o Gamarra jogando e descobrir que zagueiro também pode ser craque, ver seu time ganhar dois Brasileiros seguidos com um time de dar inveja, achar que quer cursar Educação Física, usar esparadrapo no braço pra dizer que foi fazer exame de sangue, poder dormir mais e entrar na segunda aula, parar de usar essa desculpa quando a inspetora começa a olhar estranho. Terminar o colegial sem saber o que vem pela frente mas achando que obviamente vai dar tudo certo, fazer 18 anos, perder dois amigos logo que o colegial acabou e descobrir do pior jeito que não é só velho que morre, dar ainda mais valor aos seus melhores amigos. Ter 18 anos e achar que já cresceu. Mal sabia eu que ainda tinha muito pela frente.

quarta-feira, 17 de outubro de 2012

Não é só mais um caso de nostalgia...


Mudar de cidade e começar do zero nunca foi problema pra mim. Procurar onde morar, recorrer a amigos que já moram na cidade, conhecer uma nova vizinhança, olhar o mapa da cidade para não me sentir perdido, descobrir quais linhas de ônibus levam pros lugares que preciso ir, achar uma academia, mercado, nada disso é problema pra mim, pelo contrario, eu gosto. Entre passagens bem curtas e maiores, essa é minha sétima cidade. Hoje, moro em Campinas.

Há cerca de 10 dias fui para Avaré votar, como faço desde 1996. No sábado saí para andar, ver a movimentação eleitoral, ver como estava a cidade. No domingo votei na minha antiga escola, fui com meu pai até onde ele vota, vi pessoas, vi mais lugares familiares. E foi então que eu tive certeza de algo que talvez eu já soubesse, mas que nunca havia parado pra pensar. Estou bem em Campinas, gosto do meu trabalho, fiz novos amigos, retomei contato com outros e a cidade não tem aquele frio avareense que nunca me agradou. Talvez eu viva aqui o resto da vida, talvez me mude de novo, quem sabe? Mas por mais que esteja bem com meu presente, Avaré está em mim, em quem eu sou, no meu sotaque caipira, é o lugar em que eu sempre terei casa.

Vivi lá até meus 20 anos, meu tetravô fundou a cidade, toda minha ascendência paterna, tanto pelo lado da minha vó quanto do meu vô está lá desde a fundação, quando a cidade ainda era um povoado e se chamava Rio Novo. Foi lá que minha mãe ficou, casou e fez sua carreira, depois de morar em 10 cidades até os 17 anos. É naquela vizinhança, perto da CAIC, do Industrial, do Bar do Seu Dito e da linha do trem, que eu cresci; é ali que os vizinhos mais velhos que talvez nem se lembrem do meu nome dizem oi pra um dos meninos que viram crescer, o filho do Abel, neto do Apparecido e da Therezinha. E foi no quintal desses dois que eu brinquei, joguei bola, esperei meus primos nas férias de julho e no Natal. Foi ali que um tio me ensinou a apanhar laranja do pé, mesmo que até hoje eu não consiga tirar a casca inteirinha como ele, foi quando eu morava ali que outro tio me emprestou os primeiros CDs que eu ouvi, que uma tia me levava na horta do meu vô pra colher morango e que outra tia contava a história do Cascão que colecionava tampinhas de garrafa e pneus velhos. Além desses, havia os que moravam fora, que eu esperava ansioso pois com eles vinham meus primos. É ali que mora minha vó, que sempre pergunta de mim pros meus pais e é ali que 8 anos depois ainda sinto falta de alguém quando chego e não vejo meu vô.

Nessa cidade tive meu primeiro emprego, ali fiz amigos pra vida toda, gente com quem eu cresci, brinquei, entrei em brigas, joguei bola e comecei a sair, quando íamos nas domingueiras da Associação. O começo da minha história está ali, e ali estão as pessoas para quem eu talvez nunca tenha dito, mas que sempre pude contar a qualquer momento, meus pais. E só agora, aos 32 anos, paro e vejo o óbvio, a cidade que foi praticamente meu nome durante a faculdade e que pra muitas pessoas é meu nome até hoje, a cidade do interior com tudo de bom e de ruim que cidades pequenas têm, o lugar do frio gelado que sempre ataca minha rinite é um lugar que sempre vai fazer parte de quem eu sou, sempre vai ser uma parte muito importante da minha vida. E isso não é só mais um caso de nostalgia...

quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Como a política pode ensinar a só enxergar em preto e branco


Época de eleição é uma época em que aprendemos muito. Eu, por exemplo, aprendi duas respostas que tou pensando em usar quando fizer alguma cagada:

- Thiago, você não pagou aquela conta que pedi e ficou com o dinheiro pra você?
- Eu não paguei, mas todo mundo faz isso, todo mundo deixa de pagar e gasta em cerveja. Mas o PIG, Partido da Mídia Golpista, fala como se só eu não pagasse, são uns vendidos. Isso é culpa da Veja, eu sou inocente! Além do mais, fiz isso pelo bem comum, antes de eu fazer isso tudo era pior e bem mais injusto, nunca antes na história dessa conta que eu não paguei esteve tudo tão bem.

OU

- Thiago, por que você xingou aquele cara que tava pedindo um prato de comida perto do restaurante?
- Eu não xinguei, só não aguento essa gentinha, sabe esse tipo que só quer se encostar no bolsa família? Bando de vagabundo, se tem gente pobre que consegue virar juiz, como nosso herói Barbosa, por que esse safado da frente da padaria não vai trabalhar? Culpa desses petralhas que inventam essa história de cotas, que falam como se nosso pais não desse as mesmas chances pra todo mundo, é só querer! Comunistinhas safados!

Pronto, com duas respostas-padrão dadas pelos dois lados da força você enrola e, se precisar, ainda joga a responsabilidade pelo que fez nas costas dos outros. Sem falar que um monte de gente te olha admirada, pensando que você é um cara politizado, inteligente. Viu como a gente aprende com o pessoal que tem consciência política? O que seria de nós, reles mortais, se não fosse esse pessoal que vê tão claramente o bem e o mal em tudo, né? A gente fica achando que as coisas tem várias nuances, mas o pessoal politizado nos salva quando mostra quem é o mocinho e quem é vilão. Obrigado Paulo Henrique Amorim, obrigado Reinaldo Azevedo, obrigado Pereio, obrigado Roger, sem vocês eu seria somente mais um alienado ingênuo.  

Mas peraí, e agora, que lado está certo, quem tem razão? Ah deixa pra lá, vocês são só dois lados da mesma moeda, gralhas donas da verdade que só enxergam em preto e branco. Eu, felizmente, também enxergo outras cores.

quarta-feira, 26 de setembro de 2012

Protógenes e a "censura do bem"


O que primeiro chama a atenção no fato do Deputado Federal do PC do B de São Paulo, Protogenes Queiroz, querer que tirem dos cinemas o filme TED é a patetice de ir a um filme para maiores de 16 anos com o filho de 11, ficar escandalizado e tentar enquadrá-lo como se fosse um filme infantil com mensagens que desvirtuariam as crianças e a juventude. Também acho isso motivo de riso, mas eu vejo outra coisa nesse episódio: o autoritarismo e o ainda presente gosto pela censura.

Pessoas e instituições com poder, como governos, chefes, etc. costumam censurar algo ou alguém basicamente por duas razões: para manter o poder e privilégios ou por uma suposta vontade de proteger os "mais fracos", que teriam menos discernimento pra entender as coisas, diferenciar o que é certo ou errado (conceitos muitas vezes discutíveis), ou seja, para proteger aqueles que ele considera menos capazes. Eu tenho mais medo do segundo tipo. O primeiro é claramente canalha, se ele é disfarçado a máscara cai facilmente. Já o segundo... o segundo vem acompanhado de uma aura de boas intenções, de defesa da moral e dos oprimidos, movido por uma pretensa vontade de fazer o bem. É um tipo de censura que coloca quem vai contra ela como alienados, ingênuos ou mal intencionados, em um tipo de raciocínio ultrapassado de quem só enxerga as coisas em preto e branco, 8 ou 80.

É um pensamento que infantiliza, supondo que as pessoas não podem pensar por si mesmas, já que não têm discernimento para definir o que elas é bom ou ruim, o que consideram apropriado ou não. Esse pensamento é primo-irmão daquele expresso em várias campanhas políticas, quando o candidato se coloca como o pai dos pobres, o ungido que vai “cuidar” das pessoas.

Eu digo não a qualquer tipo de censura, eu quero poder ler, assistir e ouvir o que tiver vontade, quero eu mesmo definir o que é bom pra mim ou pros meus filhos, se os tivesse. Portanto, obrigado, deputado, eu dispenso sua tentativa de salvar os valores morais e de me dizer o que eu devo ou não assistir.